31.3.07

Brás Cubas: necrofilme

Jairo Ferreira

Lançado, ou melhor, arremessado com grande estardalhaço no cine Belas Artes/sala Carmen Miranda em plena semana da Mostra Internacional do Leão Cakoff, Brás Cubas arrebatou verdadeira legião de público (mais que três espectadores em filme de Julio Bressane é uma multidão). Trata-se de uma superpriodução, sua Cléopatra, como Gigante da América foi sua Intolerância e Tabu seu Cantando na Chuva. Make em laugh. Ou o que dá chorar dá pra rir. Assim é o Rio do Cão, de Machado de Assis à transleitura bressânica, num filmepoema nada ágrafo nem iléxico ou afásico como é hoje 95% do nosso cinema.

Bressane, o maior cinepensador brasileiro da América do Sul Sol Som, dizia em Gramado 86 que agora não faz mais filmes para dois ou três cães pingados: "Faço filmes pra mim mesmo". Aí um espectador perguntou: "Então como se explica que o filme tenha chegado a Gramado?". A resposta fulminante veionum átimo: "O filme foi transportado pela Embrafilme, remetido pela distribuidora".

Houve tempo em que eu achava que a culpa por lançamentos inadequados como esse era do Marco Aurélio, da Embrafilme; agora não acho mais: sei que Bressane não está impune. Toda energia que ele libera na filmagem, no processo estético, bloqueia em relação ao marketing pós-primeira cópia, deixando tudo por conta do diabo.

Distribuição/exibição: isso interessa pouco numa fase emque nossocinema finalmente substituiu a mercadologia por uma "política nacional do cinema". A Bressane só interessa o projeto estético, a seqüência do cinema de invenção nos (agora) alegres trópicos da Lei Sarney. Então só mesmo num mercado promíscuo como o brasileiro é que se vê de experimental a hard core nas mesmas salas do cinema-padrão.


Ankito e Luis Fernando Guimarães em BRÁS CUBAS

Antiestética, nova ética. Brás Cubas de Bressane é tradução/tradição, transluciferação. TRANSCRIAÇÃO: o que Machado tinha de cinema em suas hilariantes e já modernas Memórias Póstumas (1881) é reinventado audiovisualmente em Brás Cubas o filme. Lance altamente intersemiológico. Releitura, seleção & síntese: daí os fragmentos de quase tudo do bardo de Cosme Velho já filmado, em destaque Viagem ao Fim do Mundo (1968) de Fernando Coni Campos e Capitu (68 também) de Paulo Cesar Saraceni. Reintegração antropoautofágica, transgressão ou como já referia Julio em outro interfilme um ir além cromossômico.

Mas ainda não é um filme-sumúla como é Filme Demência de Carlão Reichenbach (Bressane é sempre fac-simile, semelhante sem semelhança, como queria (M)achado em Crítica, pág. 111) Difícil de assimilar? Parece e no caso é. Como Godard Jaguadarte Julio está cagando & andando para ocinema de fórmulas. Só lhe interessa o cinema de forma, daí a ansiedade de seus cultores em saber o que ele tem agora na fôrma (o revisor que tirar o chapéu de ô ganhará um bom prêmio: assistir ao Brás Cubas de Julio Azevedo sem cochilar!) . Lance cômico & cósmico em tempos de comício. O grande desafio para o qual Julio se prepara há 25 anos é levar ao forno de microondas Os Sermões do Padre Bressane, digo, Azevedo, digo besteira, perdoe Vieira...

Ficaria com a seqüência inicial do filme & estaria bem servido. Só encontraria paralelo nas melhores antologias dos gênios do cinema. Estou errado? Viva a cinerrância. Não raro é vertente da cineverdade da melhor qualidade. (in) Descrição da Ideologia do Fotograma sem Perfuração: câmera-delírio, inversão/reversão do quadro/jaula, isto é, Bazin não teria pensado nisso: microfone anunciado necrofone. Cai o objeto do som fálico (eu disse FÁLICO, thanks doutor!) nas cavidades sensuais do esqueleto & dá uma trepadinha nos olhos do excinema, digo, caveira, interfilme das cavernas. Eis o cinema paleolítico.

Discorrer sobre a necroestrutura do filmóide? A transvisualidade aprova mas não autoriza. Teria que multiver o conjunto da cinepoesia de Julio Bressane, mais de vinte títulos,na cosmogonia do cinema de invenção. Lace hedônico que deixo em parte para um nissei ou sansei (sei lá) que bem falou em cinema-tormenta. Ainda bem que dedico este texto que nãoconsigo terminar a minha grande amiga Olgária.

PS: meu livro Cinema de Invenção esgotou a primeira edição em menos de seis meses.A segunda edição deverá sair antes das eleições de 15 de novembro. Desejando sucesso a este novo jornal-alternativo, no próximo número quero escrever sobre Nem Tudo É Verdade de Rogério Sganzerla, que se anuncia no Belas Artes em bela substituição ao Brás Cubas comentado. Mas já aviso a Sganzerla que assistirei ao filme dele com o meu advogado ao lado... Até lá, cinentusiastas!

(Jornal Imagemovimento, n. 1, novembro de 1986)

1 Comments:

At 15:27, Anonymous Anônimo said...

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